Pandemia, telas, crianças … Dá para existir uma relação saudável entre eles?

Criança no computador

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Se você é aquela mãe que sempre achou um absurdo ver outras mães dando celulares e tablets para seus filhos e está sofrendo porque não resistiu em entregá-los aos pequenos, acredite: você não está sozinha. O fato é que, de certa forma, esse comportamento foi, parcialmente, culpa da quarentena. Ou melhor, se a quarentena não criou esse cenário, tem contribuído para intensificá-lo pelas mais variadas razões. Com a suspensão das atividades escolares presenciais e de boa parte dos trabalhos, pais e filhos se viram obrigados a conviver 24 horas por dia, durante os sete dias da semana. Surge então um desafio: como preencher com qualidade o tempo das crianças sem que isso afete, por exemplo, a produtividade de pais que estão trabalhando em home office? É preciso ser muito criativo e ter disposição para acompanhar a energia de crianças confinadas há mais de três meses dentro de casa. Foi assim, em meio a esta loucura, que muitos pais que vinham resistindo bravamente a deixar que seus filhos utilizassem smartphones e tablets passaram a entregá-los, sobretudo a crianças, numa tentativa desesperada de entretê-las enquanto tentam cumprir as demandas do trabalho, inclusive o doméstico.

Se há pouco mais de 20 anos as crianças se distrairiam com brinquedos analógicos, desenhos e filmes na televisão, hoje o cenário é diferente: grande parte dos pequenos, enquanto pessoas humanas em desenvolvimento, busca modelar a própria personalidade por meio da inserção num mundo cada vez mais digital.

Se falarmos de crianças em torno dos 7 anos, por exemplo, escapar dessa sociabilidade pode ser também uma forma de exclusão – ainda mais se o seu grupo de relacionamento está online –, o que torna mais difícil para que pais digam, no alto de sua autoridade, a tão temida frase: “não é não”, depois de explicar, convencer, dialogar. E saibam: uma vez conquistado esse espaço, voltar atrás e retirar das crianças os smartphones e tablets parece ser uma missão impossível. Como será após o fim da pandemia?

Além de todas estas questões para se pensar, a saúde também preocupa.

“Com o uso excessivo de celulares, o cérebro recebe a informação de que necessitamos mais da visão de perto do que a de longe. A consequência disso é o olho se alongar e induzir miopia”, alerta o oftalmologista dr. Alexandre Onici.

E continua: “Evite dar celulares e tablets às crianças logo ao acordar e antes de dormir. À noite, a luz azul é ainda mais prejudicial, pois inibe a produção de melatonina, o hormônio do sono”, completa.

 

A fisioterapeuta Michelle Nunes Vasconcelos Buvolini, mãe da Alice, de 2 anos e 4 meses, conseguiu resistir a entrega de celular ou tablet. “Como sou fisioterapeuta, me preocupo muito com a postura – que quase sempre é ruim – quando estão mexendo nestes aparelhos. Me preocupo também com o excesso de estímulo visual, luz e proximidade com os olhos. Tento ao máximo fazer atividades para fugir das telas, priorizando livros e joguinhos”, compartilha ela que também sofre com a curiosidade da filha, que despertou ainda mais com as chamadas de vídeo com família, na qual ela participa somente com a companhia da família.

Legenda da foto: Michelle e Alice continuam resistentes às telas

Se você acha que fora do Brasil a cultura (e o problema) é diferente, saiba que é só o endereço que muda. Laura Provenzano Navajas, mãe do Victor, de 2 anos, que vive em Birmingham, na Inglaterra, não encontrou opções para distrair o filho durante o isolamento social. “Voltei a trabalhar e o meu filho ficava com a cuidadora, então, raramente ligávamos a TV aos finais de semana. Até que veio a quarentena e a televisão passou a não ser suficiente. Meu filho descobriu o tablet. Senti que ele ficou mais agitado, com mais dificuldade para dormir e, o pior, ele entra em casa agora e pede o tablet. A TV só não é mais suficiente”, conta.

Já o sentimento de culpa de Renata Monzillo Portella, mãe da Stella, de 2 anos e 2 meses amenizou quando viu o quanto a filha aprende por meio de vídeos infantis. “Ela não liga para a TV e não é toda hora que consigo estar sentada, brincando com ela; o home office e os afazeres de casa tomam nosso tempo, Acabei cedendo”, conta.

Um estudo canadense publicado no início deste ano apontou que crianças pequenas que passam muito tempo usando celulares, tablets e outras telas podem ter atrasos no desenvolvimento de linguagem e sociabilidade.
Portanto, dosar o tempo que essa turminha fica conectada aos gadgets é um passo importante para que esta relação com a tecnologia comece de forma saudável.

De acordo com especialistas, o vício em celular já pode até ser comparado ao vício em drogas. Segundo Mario Louzã, médico psiquiatra formado pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), “o princípio de qualquer dependência é muito parecido, seja químico ou comportamental. Você tem desejo intenso de buscar aquilo. O segundo aspecto é a síndrome de abstinência. Quando fica sem usar você tem reações de ansiedade, irritabilidade. E o terceiro ponto é a tolerância. O uso contínuo faz a pessoa querer aumentar a dose para ter o mesmo efeito”, explica.

 

 

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