INTRODUÇÃO: MARIANA MARÇAL
ENTREVISTA: ESTER JACOPETTI
IMAGENS: VINÍCIUS MOCHIZUKI
Era no interior de São Paulo, mais precisamente em Bauru, que Edson Celulari sonhava com a carreira de jogador de futebol. A família morou na zona rural até o filho completar 14 anos e se mudou para a capital.
Seu pai arrendou a cantina da escola em que os filhos estudavam. Acontece que a lanchonete ficava na coxia do teatro, por onde era preciso passar para chegar até lá. Nesse trajeto Edson parava no palco e começava a imitar os cantores, sem que ninguém me olhasse.
Então, escreveu um texto, dirigiu e atuou. Um monólogo. E convidou seu pai. Começou a fazer o espetáculo, de olho na plateia, de olho no pai. Até que, no final, ele disse: ‘Meu filho, você tem jeito para isso. Tem faculdade disso?’. Edson passou na USP.
Em 1978, Edson fez a sua estreia na TV Tupi em “Salário Mínimo”.
Em 1992, Edson Celulari atuou ao lado de Claudia Raia em “Deus Nos Acuda”, época em que engataram um relacionamento. Do casamento, nascerem os filhos Enzo e Sophia.
Em 2016 enfrentou o Linfoma não Hodgkin. Dilma Rousseff, Reynaldo Gianecchini e Glória Perez enfrentaram o mesmo câncer.
Em outubro de 2017, Edson Celulari se casou com a atriz e arquiteta Karin Roepke em uma cerimônia íntima na Itália. Os dois estavam juntos desde 2012.
Em 2018, Edson Celulari ganhou o seu primeiro protagonista na televisão.
Agora que a gente já te contou um pouco da vida desde ator, venha curtir essa entrevista exclusiva.
São 5 anos longe das novelas na TV aberta e agora você retorna em “Fuzuê” com o Nero. Como tem sido essa retomada ao trabalho?
Primeiramente, é uma alegria participar deste projeto com tantos colegas com quem já trabalhei, incluindo um elenco experiente e diversos rostos novos. O Nero é um personagem incrível que transmite emoção, amor e civilidade, exalando positividade. Impulsivo e forte, interpretá-lo é um prazer. Ele é um pai dedicado e amoroso. Como qualquer pai, é apegado a seus filhos, valorizando a singularidade de cada um – sentimento que também compartilho na vida real. Ele visualiza todos, desde os filhos até funcionários e clientes, como integrantes de uma grande comunidade.
Existe algum personagem que você interpretou e que tenha deixado um impacto duradouro em sua vida pessoal ou carreira?
A televisão me proporcionou e tem proporcionado muitos bons personagens, mas geralmente, o que mais me impacta é o último ou o atual, por ser o mais recente em minha memória. Dos mais antigos, destaco o Vadinho de “Dona Flor” (1998), adaptação do romance de Jorge Amado. Foi um trabalho maravilhoso e um personagem inesquecível. Em “Fera Ferida” (1993), tive a oportunidade de interpretar o Flamel, outro papel marcante. O Jean Pierre de “Que Rei Sou Eu” (1989) e o Dom Sabino de “O Tempo Não Para” (2018) também foram personagens que me marcaram.
Edson, você tem um método de criação quando vai interpretar um novo personagem? De que maneira você se prepara? Como você se conecta com seus personagens?
Quem comanda isso é o personagem, a obra e a direção. Se repetíssemos o mesmo método, iria tornar-se comum e pouco criativo. Sou atingido pelo personagem, e isso impulsiona em mim uma alavanca de aproximação, curiosidade, pesquisa e aprofundamento humano. Desse modo, cria-se um processo criativo específico para o personagem e para a obra. Aproximo-me intuitivamente e esse é, talvez, o momento mais belo de um processo, seja no teatro, televisão ou cinema: quando estou totalmente aberto a receber informações do personagem e livre para escolher caminhos.
A indústria cinematográfica e televisiva passou por muitas mudanças ao longo dos anos. Como você vê essa evolução?
Durante meus quarenta anos de carreira, vi a evolução do folhetim na televisão, partindo da influência do melodrama mexicano. O Brasil aproveitou uma mão de obra oriunda do rádio, e essa combinação conferiu uma tonalidade única ao nosso conteúdo televisivo. Hoje, possuímos uma TV de excelência, e, simultaneamente, surgiu o streaming, a TV a cabo e outros formatos além da tradicional novela. O cinema também se fundiu com as tendências da TV e do streaming, criando uma interação proveitosa. Seria prejudicial resistir a essas combinações.
A diversidade na indústria do entretenimento tem sido um tópico importante nos últimos anos. Como você enxerga o papel dos atores na promoção da diversidade e da representação autêntica?
Eu acredito que o entretenimento nunca esteve tão próximo da realidade. Para ser eficaz, ele precisa refletir os arquétipos com os quais o público possa se identificar. A dramaturgia, em seu conteúdo ficcional, oferece a oportunidade de narrar histórias ligadas à realidade social, abordando famílias compostas por filhos, netos, pais, avós e primos. Assim como na vida no Brasil e em outras partes do mundo, essas famílias são frequentemente uma mistura de raças. As representações devem ser cada vez mais inclusivas, garantindo espaço para homens, mulheres, negros, brancos, indígenas e estrangeiros. Vejo isso com otimismo, pois acredito que, quanto mais diversificado e próximo da realidade, melhor.
Ao longo de sua carreira, você teve a oportunidade de explorar diferentes gêneros, como drama, comédia e até mesmo musical. Existe algum gênero que você ainda deseja explorar como ator?
Eu tive a experiência de dirigir e atuar num longa-metragem de suspense, o que adorei. No entanto, também gostaria de experimentar como ator no gênero terror. Quero assustar as pessoas, contar a história através do medo e tudo que envolve esse gênero.
Como você vê o futuro da indústria do entretenimento no Brasil? Existem tendências ou mudanças que você acredita que moldaram como consumimos conteúdo audiovisual?
A incógnita reside no futuro da expressão artística e cultural em nosso país, mas é imprescindível que haja espaço para ela e que os governos a apoiem e estimulem. A arte deve ser intrínseca à vida humana, pois ela tem o poder de salvar. Durante a pandemia, muitos encontraram refúgio em filmes, músicas e livros disponíveis em plataformas de streaming e televisões. A indústria do entretenimento é cheia de incertezas, mas isso é o que a torna vibrante. Se tudo fosse previsível, nos arriscaríamos a ter uma cultura monocórdica. A diversidade de talentos e criatividade é o que a torna especial. Recentemente, participei do Festival de Cinema de Pernambuco, onde testemunhei uma miríade de ideias inovadoras e originais, que reforçam o potencial artístico do nosso país. Após um período sombrio que vivenciamos, espero ver as artes e a cultura sendo valorizadas e incentivadas novamente. Sou otimista quanto ao futuro do Brasil na cena artística mundial. Nossas ideias criativas, não apenas no audiovisual, mas também no teatro, têm grande potencial para serem reconhecidas globalmente.
Edson, diante das gravações constantes e do pouco tempo em família, de que maneira você aproveita os dias de folga ao lado da pequena Chiara e sua esposa Karin Roepke? Como tem sido reviver um pouco desse momento agora, nesta nova fase da sua vida?
Eu tenho uma perspectiva sobre trabalho que diverge do usual, de que ele é exaustivo e cansativo. Há muitos anos, desde quando meus filhos mais velhos eram pequenos, eu saía de casa dizendo: “papai vai trabalhar e ama o que faz, então voltará feliz”. É a ideia de que quanto mais energia gastamos, mais adquirimos. Para mim, o trabalho é vital, especialmente quando é criativo e expressivo. E sim, é possível conciliar com a vida doméstica. Valorizo uma rotina caseira rica, colaborando em tarefas como arrumar a cama e dar banho na minha filha mais nova. Minha idade não determina se sou um pai melhor ou pior em comparação com quando era mais jovem. O que importa é a qualidade de pai que você é. A experiência pode ajudar, mas há desafios em todas as fases da paternidade. Cada filho é único e exige sensibilidade e entendimento para perceber suas necessidades, oferecendo apoio, afeto e acolhimento. A vivência diária nos enriquece, inclusive como artistas. Muitas das nossas experiências alimentam os personagens que interpretamos, especialmente quando amamos nossa profissão.