“O Brasil precisa começar a ser incrível como é, assim como as pessoas de fora veem“
Entrevista: Ester Jacopetti
Introdução: Mariana Marçal
Poliglota, candomblecista, vegana, botafoguense, ariana, nascida e criada em Honório Gurgel, subúrbio do Rio de Janeiro, Larissa de Macedo Machado reúne tantas habilidades que, juntas, formaram um fenômeno conhecido como Anitta. E você gostando ou não de suas músicas tem que se conformar que sim, ela é um fenômeno mundial.
É a filha mais nova da artesã paraibana Miriam Macedo com o vendedor mineiro Mauro Machado.
Começou cantando na igreja e, atualmente, coleciona prêmios internacionais. Se não bastasse tantas músicas gravadas, clipes produzidos, uma agenda de shows invejável e o título de uma das celebridades mais influentes do mundo – listada pela Vogue -, sobra um tempinho para gerenciar a sua própria carreira, sendo elogiada por grandes nomes da área de marketing e gestão de negócios.
Em 2020, a revista Forbes incluiu o nome de Anitta na lista das mulheres mais poderosas do Brasil.
Quer mais?
Ela foi imortalizada com uma estátua pelo museu de cera mais famoso do mundo, o Madame Tussauds, em Nova York. Da garota que fez seu primeiro grande show em 2012, no Piscinão de Ramos, no Rio de Janeiro, hoje tem suas músicas gravadas em cinco idiomas, firmando a posição Top5 em alguns países.
É… o funk venceu!
Anitta, você apareceu na capa da Bazaar americana, na página do instagram da Vogue americana e foi convidada para assistir ao desfile da Louis Vuitton em Paris, além do show da Champions League. O funk e a favela venceram?
Sim. Eu acho que venceu e muito! Seguimos vencendo e todo mundo lá fora – inclusive os rappers – estão falando em querer fazer brazilian funk. Super chegamos lá, mas eu acho que você – em breve – vai ver o funk ser o próximo ritmo do mundo, eu tenho certeza disso, era o meu sonho, sempre foi. Vamos ver uma leva disso acontecendo sem parar. Eu tenho certeza de que iremos ver vários rappers e artistas americanos fazendo funk cada vez mais e vai virar um reggaeton.
Eu tenho certeza absoluta.
Qual o peso de representar o país internacionalmente?
Estamos falando de 300 milhões de pessoas, cada um querendo ser representado assim ou assado, claro que cada um vai querer uma coisa, por isso, eu não tento representar ninguém, quando eu digo isso não é num mal sentido, mas é eu tentar representar a mim e a minha cultura, ser leal e fiel a mim. Quem se sentir representado, ótimo, mas quem não se sentir, é só fazer um trabalho que represente a sua realidade. Não dá pra gente agradar todo mundo.
Anitta, você é uma mulher transgressora, em que momento deixou de se importar com a opinião alheia? Você lembra desse momento?
Lembro exatamente. Foi quando eu fiz plástica e fui ao programa do Faustão porque eu não queria perder a oportunidade de ganhar aquele prêmio, era a primeira vez que o funk ganhava numa TV aberta, e eu fui, toda plastificada, e a galera acabou comigo. Eu lembro que ainda estava me recuperando, e eu e minha mãe trocávamos de canal, e todos estavam acabando comigo por causa de uma plástica, uma coisa que todo mundo faz e sempre fez. Minha mãe falou: “as pessoas são doidas”, o povo adora gente hipócrita e vai falar mal, sempre. Quer saber? Não tenho que ligar mesmo. Parei. Eu apertei um botão, e eu realmente fui viver a minha vida, e desde então estou sendo muito feliz.
Na sétima temporada de Elite, Netflix, você encara uma personagem. Como ficaram as suas expectativas com o seu primeiro papel numa série?
Foi uma escola pra mim; eu queria muito voltar pra próxima temporada. Eles me convidaram, mas acho que não vou conseguir por conta da agenda, porque realmente com o álbum ficou uma loucura. Mas o que acontece é que eu recebi o convite para atuar em várias coisas. E um deles eu aceitei. Queria muito chegar com certa experiência. O convite acontece há muito tempo e eu nunca tive agenda, mas, desta vez, armamos uma brecha porque eu queria ter essa experiência de aprender fazendo, de como é estar num set, o comportamento. Eu não gosto de fazer nada sem ter uma noção, gosto de estudar antes, ter maturidade nas coisas, cheguei com essa ideia de aprender e eles me ensinaram muito. Eu amei! O meu papel não é minúsculo, mas também não é muito grande. Eu vou estar em mais de um episódio; é um papel bacana, mas ao mesmo tempo não exige de mim a atenção de um protagonista; eu não faria isso, não seria justo comigo, de primeira, cair de paraquedas numa coisa grande pra ser julgada e tendo que entregar um resultado que eu ainda não me sentia preparada. Eu queria aprender antes com um papel menor e quanto tiver musculatura, quando for pra coisas maiores, estar mais experiente. Vocês vão me ver aprendendo. Não tem nada de Fernanda Torres ou um Oscar, não. Estou aprendendo com humildade e está tudo certo.
Você falou que tiraria uns dias de férias, mas agora está trabalhando na divulgação de ‘Funk Rave’. Como programa os dias de descanso em meio a correria da vida.
Eu ainda estou programando mais períodos de descanso, vamos aproveitar que estamos nesse carpe diem (aproveite o dia). Eu não tenho opção de ter mais dias, porque na verdade, eu não imaginava que assinaria com uma gravadora nova, que eu mudaria de manager, não sabia que tanta coisa incrível ia acontecer em tão pouco tempo. De repente a vida sorriu pra mim e eu sorri de volta. Eu aproveitei enquanto estava na Europa, mas agora com o lançamento voltei pra labuta. Eu não nasci herdeira, tem que encher o cofrinho novamente pra poder gastar tudo de novo. Não terei férias tão cedo porque, se Deus quiser, vai ser mais um sucesso. Está tudo ótimo, estou amando, estou super feliz, acordei e tá chovendo sucesso, chovendo boy, equipe maravilhosa. A vida está tão perfeita que eu vou até ligar pro meu pai de santo e pedir pra ele fazer umas proteções porque está bom demais.
Você faz um retorno às suas raízes que é o funk carioca. Sabemos que um dos maiores objetivos da sua carreira internacional é mostrar o Brasil para o mundo, com o funk exportação. Que mensagem você gostaria de passar e, pensando nisso, qual o seu papel na liderança, nas decisões criativas?
Quero passar a minha mensagem, da cultura que me identifico, e talvez muitas pessoas não se sintam representadas. O Brasil é muito grande, não dá pra eu representá-lo com a minha cultura, com a minha história. Não é possível mostrar tudo o que é o Brasil em um único álbum. Com esse trabalho, a minha intenção é mostrar as minhas raízes, a minha realidade. Eu nasci e cresci no subúrbio, numa comunidade do Rio de Janeiro. Minha intenção é mostrar o início da minha carreira e os looks que eu usava antigamente, na minha adolescência, estão presentes. Nós temos mais de 40 músicas prontas. Estou numa fase de decidir quais entrarão no álbum porque estou apaixonada por tudo. Estou numa sinuca. Não é uma questão de funk exportação. O que estou fazendo é algo que estou muito acostumada, a diferença é que estou cantando em inglês e espanhol. Não estou fazendo nada com a intenção de ser diferente. O funk está ganhando mais espaço, as pessoas estão mais interessadas. Querendo ou não chegamos lá, esse é o propósito. Esse single mostra o que vai ser o resto do álbum, as músicas terão esse estilo, super coeso, redondo, coerente, as músicas têm essa pegada do Brasil, do funk carioca, algumas mais estilo funk melody que eu fazia antigamente, outras mais dançantes, e os clipes, todos com essa estética. Sempre foi o meu sonho fazer um álbum assim, mas tive dificuldades de encontrar um time que estivesse alinhado e acreditando. Estou feliz porque conseguimos chegar nessa fórmula. Com certeza viajaremos pelo Brasil e pelo mundo inteiro. Estamos nos organizando. Eu fiz uma grande troca, gravadora, manager, eu sou muito intensa. Tudo que eu faço, quero tudo de uma vez, sou uma enxurrada de acontecimentos. Mas no final dá tudo certo.
O clipe conta com a presença de pessoas pretas. Qual o debate político você quis levantar?
Eu não quis gerar nenhum debate político com o clipe, eu quis mostrar a realidade da minha área, das coisas que eu fazia quando era adolescente, quando comecei a minha carreira, e retratar o mais real possível. Eu não tive intenção política. Às vezes eu tenho os meus pensamentos de debate. Quando eu coloquei as minhas celulites no clipe ou quando coloquei a Amazônia, às vezes eu até tenho, mas desta vez, em todo álbum era mais pra retratar o que eu vivi.
Como surgiu a ideia do clipe ‘Funk Rave’? Você já tinha ideia do que queria fazer?
Na verdade, quando estou fazendo as músicas, sempre tenho na minha cabeça ideias de cada clipe, coreografia e tal. Pra cada música do álbum eu já descrevo o clipe, de como eu gostaria de fazer, jogo de futebol, neste caso, ou como nos outros clipes que tem piscina de plástico; eu tomava muito banho de piscina de plástico quando era adolescente.
Anitta, você acredita que o funk é mais valorizado fora do país, principalmente quando pensamos nas premiações brasileiras?
Sim, o funk é mais valorizado lá fora; eu, particularmente, sou mais valorizada fora do Brasil quando pensamos em premiações, sou mais lembrada, tanto que os meus maiores convites, minhas maiores oportunidades e prêmios, primeiro recebi fora do Brasil pra depois ser reconhecida aqui dentro. Mas é um problema do brasileiro não valorizar muito o que é nosso. Não acho que é comigo em particular, é cultural, de dar valor ao que é ‘importado’. E fora do país as pessoas olham pra gente com admiração porque nós temos um grande diferencial cultural, somos diferentes. Por isso, acredito que lá fora eu receba muito mais oportunidades do que no Brasil: respeito, prêmios, visibilidade, etc. O Brasil precisa começar a ser incrível como é, assim como as pessoas de fora veem.