Por Ester Jacopetti
Introdução de Mariana Marçal
Fotos: Muniky Sena
Assim Como a grande maioria dos brasileiros, Monica Iozzi, 39, aproveitou a quarentena para fazer coisas que não faria dentro da normalidade de uma vida comum: ela usou seus dias de confinamento para criar o seu mais novo programa, rodar uma série portuguesa, reatar o namoro com o empresário Gabriel Moura e voltar a morar com a mãe. Paulista do interior de São Paulo – de Ribeirão Preto, filha de um eletricista e de uma dona de casa, aos 19 anos, entre idas e vindas para Campinas e São Paulo para se dedicar aos estudos, a humorista foi trilhando sua carreira e construindo sua militância.
Formada em Artes Cênicas pela UNICAMP e obcecada pelo horário eleitoral desde muito pequena, por quatro anos foi repórter do CQC (Custe o Que Custar), da Band; agora, Monica vai poder destilar seu humor afiado (e inteligente) no “Fale Mais Sobre Isso, Iozzi”, programa que vai ao ar no Canal Brasil e que terá o papel educativo de explicar – de forma simples e bem-humorada – como às instituições funcionam e resgatar o brasileiro para as discussões políticas que permeiam a democracia. “Quando você convida as pessoas para refletirem sobre um tema rindo, fica mais fácil”, conta. Aliás, a atriz que já contracenou ao lado de feras como Tony Ramos, garantiu:
“Não, não são todos os políticos que são ruins, tem pessoas boas!”
Será uma luz no fim do túnel?
Queremos saber mais sobre isso, Monica.
Monica, você está estreando um novo programa no Canal Brasil, ‘Fale Mais Sobre Isso, Iozzi’; como aconteceu a concepção deste projeto
Eu sempre tive vontade de fazer um programa que falasse sobre política. Desde os tempos em que eu era repórter no CQC, sempre senti, conversando com o público nas redes sociais e nas ruas, um desinteresse muito grande por política. Eu tinha a impressão de que isso acontecia por dois motivos: ou porque as pessoas eram completamente descrentes da política – elas realmente acreditavam que é uma engrenagem muito antiga e totalmente corrompida, que político é tudo bandido – ou por desconhecimento mesmo, por elas não entenderem como as instituições funcionam. O que o vereador que você votou vai fazer por você? O que o Congresso Nacional faz? Eu quis juntar essas duas coisas e fazer de um jeito que as pessoas entendessem como funciona as engrenagens básicas do mecanismo político e abordar sobre o futuro da política, da importância de se interessar e tentar deixar claro que não, não são todos os políticos que são ruins, tem pessoas boas, sem citar nomes, mas de grupos que não fazem parte da política convencional, grupos na sociedade civil, porque a política não é só os caras que estão lá, tem a nossa política que fazemos no dia a dia. Todas as nossas ações são políticas em alguma instâncias.. Minha vontade era falar com pessoas de várias áreas diferentes. Como se estivéssemos numa mesa de bar, entre amigos que são de áreas diferentes, e começássemos a falar sobre política.
De que maneira o humor está inserido no programa?
O humor está ligado à política desde sempre. Se você pegar os jornais antigos, desde antes da existência da televisão, uma das coisas que as pessoas mais gostavam era abrir o jornal para ver qual era a charge daquela semana, daquele dia, e geralmente se tratava de figuras políticas. O humor é uma ferramenta muito interessante pra gente colocar uma lente de aumento sobre o que está acontecendo, porque quando você convida as pessoas para refletirem sobre um tema rindo, fica mais fácil. O humor tem essa capacidade maravilhosa de fazer com que as pessoas prestem atenção no tema, se questionem a respeito, às vezes sem perceber, de forma bem sútil. No programa, a ideia do humor é deixar os convidados livres para falarem da maneira que quiserem, inclusive, se quiserem criticar ou tirar sarro de alguma coisa; às vezes, uma colocação gera uma piada. Não planejamos humor no roteiro, deixamos as pessoas livres para o fazerem naturalmente.
Você comentou sobre o desejo de ter um programa. Como você define este: talk show, roda de conversa? Qual a importância da chegada deste programa no canal, principalmente, neste momento, de ano eleitoral?
É uma roda de conversa. Nós temos opiniões divergentes e pessoas que concordam, mas trazendo aspectos diferentes sobre o tema; a ideia da roda de conversa cabe melhor no programa e também faz com o que o público em casa se sinta fazendo parte. Quando está todo mundo ali, falando de maneira mais coloquial, as pessoas se sentem participando daquela mesa, é muito legal. É claro que vamos falar da política atual, mas de uma maneira macro, digamos assim; não falamos especificamente de convidados, não falamos diretamente de notícias deste momento; a ideia do programa é realmente falar sobre política de uma maneira bem abrangente, desde os primeiros passos, explicando a diferença entre os três poderes, o processo eleitoral, como é a história da política. Não existe nenhum tipo de conflito por ser um ano eleitoral. Esse era o lado que poderia ter algum revés. Mas vem o lado bom, porque eu acho ótimo estarmos estreando num ano eleitoral. Porque a ideia é atrair as pessoas para o tema. Explicar como funciona e, de repente, melhorar um pouco o debate para essas eleições. Pode ser um pouco pretensioso, mas essa é a minha esperança, de que o programa consiga fazer com que as pessoas se aproximem da política, entendam melhor e tenham esperança. Quem sabe se a gente se informar melhor, a gente vota melhor.
Nestes episódios haverá também um equilíbrio entre pensamento conservador e progressista?
Quando começamos a pensar no programa era quase um desespero pra deixa-lo o mais eclético possível; é claro que nunca pensei em dar voz para pessoas que trabalham com os extremos. Nós precisamos prestar atenção pra quem a gente dá voz. Eu queria conseguir trazer pessoas de todo espectro político, e acho que dava pra ter trazido um pouco mais, porque a discussão é frutífera, mesmo quando pessoas discordam. Nós temos pessoas muito inteligentes que tem um olhar aberto para discussão. Eu gostaria de ter trazido pessoas que tenham pensamento econômico neoliberalista, por exemplo. Esse lado conservador é mais fácil da gente alcançar. Eu senti um pouco de dificuldade de encontrar pessoas que estivessem dispostas a falar, dialogar. Mas estamos num momento tão polarizado, que não foi fácil. Tentei um equilíbrio, mas com a polarização que estamos vivendo, não foi muito fácil. A ideia do programa não é nem um pouco ser panfletário, mas falar sobre tudo, dar espaço pra tudo, exceto para discurso de ódio, óbvio.
No episódio três vocês discutem, inclusive, sobre a importância de conversar com pessoas que pensam diferente.
Esse episódio chama ‘o ideológico é você’. Hoje em dia, falar de ideologia é um xingamento, é apontar o dedo para o outro e criticar sem saber exatamente do que se trata. Neste episódio, falamos sobre polarização. Nos faz entender os ideais de vários grupos, se é possível acabar com a polarização e construir pontes para melhorar o diálogo.
Como foi escolher o elenco dessa primeira temporada, esse mix de pessoas completamente diferentes?
É engraçado, mas não tem muita gente que gosta de falar sobre política, artistas e tal (…) aliás, temos sim, vou me corrigir, temos muita gente que fala sobre política, mas pensando na quantidade de famosos que temos no Brasil, não sei se é a maioria que topa falar; eu tenho a impressão que não. Tem bastante gente que prefere se abster ou ser mais discreto, por mais que eu tenha falado que o programa tem um olhar macro, apartidário. Alguns nomes vinham na minha cabeça, que são pessoas que pensam política, que falam não diretamente da política partidária, mas que fazem da política presente na sua vida, são seres políticos. Eu queria pessoas de áreas diferentes: cantores, apresentadores, músicos, atores, como historiadores, escritores, jornalistas, professores. Conseguimos fazer uma mistura interessante. Fugimos um pouco do óbvio quando optamos colocar essas pessoas para falar sobre temas que elas não estão acostumadas. Por exemplo, a Djamila Ribeiro – que tem um trabalho falando sobre a luta contra o racismo, sobre feminismo negro – ela fala sobre os três poderes, a visão dela a partir do conhecimento e da vida dela sobre a divisão dos três poderes. Isso provoca um debate e as pessoas acabam falando sobre um assunto que elas nunca falaram publicamente.
Você poderia dizer que está contemplando a diversidade?
“Não dá pra gente fazer nada sem ter esse olhar. Se você sabe onde encontrar branco e onde encontrar preto, é porque existe apartheid.”
Essa reflexão é um exemplo do quanto temos que estar atentos. Não é possível que as coisas continuem dessa maneira, que a gente veja tudo isso acontecendo, toda essa segregação, e não fazer nada. Nós tivemos uma preocupação em fazer um programa o mais diverso possível; não ficou como eu gostaria, mas tentamos. Eu gostaria de ter indígenas falando, mas tivemos dificuldade de agenda, de conseguir retornos e contatos. Nós tivemos uma preocupação de trazer pessoas que, às vezes, não tem tanto espaço ou que não são ouvidas como deveriam. Trabalhar com diversidade é também trazer pessoas que fazem parte das minorias. As pessoas têm diversos conhecimentos, são talentosas. Eu vou chamar uma pessoa do LGTQIA+ só pra falar de homofobia? Ou uma pessoa preta pra falar só sobre racismo? A inclusão tem a ver com isso também.